Data de lançamento 21 de junho de 2018 (1h 20min)
Direção: Heitor Dhalia
Elenco: Fabrício Boliveira, Samira Carvalho, José Dumont mais
Gênero Drama
Nacionalidade Brasil
por Reinaldo Barros
Tal como o elemento químico, esse filme também tem a função de iluminar e ele vem para te abrir os olhos enquanto te entretém. Tungstênio é a primeira adaptação de um quadrinho nacional, escrito e ilustrado por Marcello Quintanilha. A HQ foi publicada em 2014 e premiada no Festival de Angoulême. O próprio Quintanilha participou do roteiro e disse ter ficado surpreso com a fidelidade à sua obra. E de fato foi fiel, pois fiz questão de procurar pelo quadrinho antes de começar a escrever. A direção e produção ficaram por conta de Heitor Dhalia.
Quando digo que essa obra vem para abrir os olhos é porque ela joga luz sobre algumas questões contemporâneas, aborda alguns problemas sem a pretensão de resolver, e o melhor é a dicotomização que acontece dentro dos personagens. Vemos personagens humanos, como na vida fora das telas, sem aquela retidão arquetípica ou a vilania caricata. Esses personagens são movidos pelos seus instintos, ora por desejos em ebulição, ora por desejos arrefecidos. O elenco está impecável e a estreante da sétima arte arrasou.
Aqui o protagonismo se divide em 4. Fabricio Boliveira dá vida a Richard, um agente da lei que em diversas ocasiões prefere seguir à margem para cumprir seus objetivos. A modelo e atriz Samira Carvalho interpreta Keira, uma esposa presa num relacionamento abusivo eu já não suporta mais a relação. José Dumont assume o papel de Seu Ney, um bolsonariano sargento do exército aposentado, que vive se recordando dos tempos “áureos” da ditadura e se envolvendo em confusões com quem não presta continência. Wesley Guimarães é o Caju, um garoto da periferia, que viu no tráfico uma oportunidade para ganhar um trocado e sobreviver.
Essas histórias começam a se entrelaçar e dar corpo ao filme quando dois pescadores cometem um crime ambiental que é presenciado por Seu Ney e Caju. Instantes depois Richard é acionado para resolver o caso. Enquanto isso Keira fica sem respostas sobre o paradeiro de seu marido e é tomada por lembranças tristes e pesadas, que a fazem refletir a respeito de seu casamento.
A partir daí vamos conhecendo os personagens e a complexidade de cada um e os recursos utilizados no filme são os mesmo do quadrinho, flashback e a narração, que no filme ganhou a voz de Milhem Cortaz. A intensidade do filme é tamanha que temos a impressão de ter assistido um curta e não um longa de uma hora e trinta minutos. Outro ponto positivo é o equilíbrio entre os momentos mais tensos e descontraídos, pois além de pensar sobre questões seríssimas como violência policial, relacionamento abusivo e fascismo nostálgico ainda dá para dar umas risadas com as micro reviravoltas e com alguns diálogos. O texto é excelente, na medida para cada um e em nenhum momento traz desconforto como aqueles característicos de novelas.
O único ponto negativo que me incomodou foi justamente a narração. Ela está bem-feita e em alguns momentos é necessária, porém tem algumas cenas que ela não nos deixa contemplar direito as expressões dos personagens, a profundidade do sofrimento.
* O Reinaldo Barros esteve na Pré estreia essa semana, ele não entrevistou os atores mas conversou com a atriz Samira Carvalho - coloquei nos stories do Instagram- que falou um pouco sobre a personagem. Confiram algumas fotos abaixo.
O diretor do filme recentemente deu uma entrevista falando um pouco mais sobre o filme, vocês podem conferir a entrevista abaixo além de um vídeo com alguns depoimentos dele e o trailer, confiram abaixo. O longa estreia hoje em todo o Brasil.
Entrevista
Confira a entrevista na íntegra com Heitor Dhalia:Como surgiu a ideia de filmar Tungstênio? O quadrinho foi me apresentado por um produtor e amigo que tinha interesse em adaptar a grafic novel de Marcello Quintanilha. Ele acabou desistindo e segui com o projeto. Entrei em contato com o Marcello e fizemos o primeiro tratamento. Por coincidência o Marçal Aquino, amigo e parceiro de longa data - fizemos o Nina e O Cheiro do Ralojuntos -, também estava interessado em adaptar a obra. Retomamos nossa parceria e levamos a ideia até Guel Arraes, que deu sinal verde para tocarmos o projeto.
O que te chamou mais atenção nos quadrinhos que despertou a vontade de adaptar a obra para o cinema? Tungstênio é um quadrinho que aborda um universo suburbano, periférico e violento. É um forte retrato da exclusão e das tensões sociais que vivemos no Brasil. A violência urbana é um subproduto dessa desigualdade e isso me interessou no quadrinho. Tungstênio trata de questões atuais, de temas explosivos, mas faz isso de maneira dinâmica e com uma estrutura de linguagem bem inovadora. Isso tudo combinado, me fez querer levar essa história para as telas.
Quais foram as maiores preocupações e desafios dessa adaptação? Minhas preocupações foram tentar traduzir a essência do material adaptado para a tela do cinema e como traduzir a narrativa de uma linguagem para outra. Tungstênio tem desafios extras, existem muitas cenas de ação, briga, cenas no mar que é dificílimo. Um ponto de atenção era traduzir aquela prosódia do personagem para a boca dos atores. Tungstênio foi uma adaptação bem complexa de ser realizada.
Como foi o processo de escolha do elenco? O processo de escolha do elenco é sempre mágico. Fizemos muitas oficinas com atores de Salvador até encontrarmos as pessoas certas para dar corpo e voz para aqueles personagens. O longa tem muitos personagens negros, o que tornou a procura por atores nos grupos de teatros locais maravilhosa. Foi um processo muito rico de troca e aprendizados. Tive a sorte de trabalhar com o Fabrício Boliveira e com Zé Dumont, e de achar a Samira Carvalho e o Wesley Guimarães.
Ainda sobre o elenco, especificamente sobre Samira Carvalho e Wesley Guimarães, não é a primeira vez que atores estreantes se destacam com importantes papeis em seus filmes. Você procura dar oportunidade para esses profissionais em todos os seus projetos? Especificamente em Tungstênio, como foi o processo para encontrá-los? Adoro encontrar atores novos, e trabalho com dois produtores de elenco geniais, Chico Aciolly e Ana Luiza. Os dois têm muito bom gosto para atores e adoram fazer escolhas ousadas. Eu também gosto. Acho importante trazer caras novas para o cinema e mais que isso, achar o ator certo para cada personagem.
Como se deu a preparação do elenco e qual foi seu método de trabalho com os atores no set? Você trabalhou com cada ator individualmente? Temos um método de preparação em grupo e individual. Por meio de várias técnicas, vamos achando o tom e aproximando os atores dos personagens, mas o mais importante nesse processo é estabelecer uma ponte de confiança entre ator e diretor. Um canal de comunicação permanente para os riscos e desafios do processo de produção de um filme, onde entra o restante da equipe. O processo de entendimento da dramaturgia e de como cada ator funciona é muito importante.
Do elenco à equipe de produção, você formou um time majoritariamente baiano. Foi proposital? Como se de essa escolha? Foi uma escolha natural, pois a Bahia tem equipes e atores maravilhosos. Tivemos a sorte de encontrar pessoas para defender este filme.
O longa levanta discussões muito presentes em nossa sociedade, como: as relações de poder, relacionamentos tóxicos, saudosismo militar, marginalização e até mesmo crime ambiental, entre outros. Juntos, esses temas provocam uma explosão e tensão social. Esse é o tema central da obra? Tungstênio é um filme que trata de relações humanas esgarçadas pelo entorno. A pobreza, a corrupção e a violência social pressionam os personagens em todos os momentos. O filme se passa numa região violenta e periférica. Um dos protagonistas é policial, o outro um pequeno traficante e por fim, temos um ex-militar saudosista da ditatura. Esses personagens são tragados para uma situação de conflito, a partir de um evento aleatório, um crime ambiental. De alguma maneira, Tungstênio captura muitos temas do Brasil atual. O Seu Ney, por exemplo, é um ex-militar, uma sátira, um retrato do Brasil atual. Nunca imaginei que teríamos uma possibilidade real de uma volta de um regime militar que pode se dar inclusive pelo voto. Tungstênio mostra um Brasil cheio de ódio, de relações esgarçadas e conflituosas. Traz o tempo do abuso de gênero, do racismo estrutural e vários outros temas importantes de serem debatidos. Acho um filme que provoca um olhar crítico para o País de hoje.
O que te chamou mais atenção nos quadrinhos que despertou a vontade de adaptar a obra para o cinema? Tungstênio é um quadrinho que aborda um universo suburbano, periférico e violento. É um forte retrato da exclusão e das tensões sociais que vivemos no Brasil. A violência urbana é um subproduto dessa desigualdade e isso me interessou no quadrinho. Tungstênio trata de questões atuais, de temas explosivos, mas faz isso de maneira dinâmica e com uma estrutura de linguagem bem inovadora. Isso tudo combinado, me fez querer levar essa história para as telas.
Quais foram as maiores preocupações e desafios dessa adaptação? Minhas preocupações foram tentar traduzir a essência do material adaptado para a tela do cinema e como traduzir a narrativa de uma linguagem para outra. Tungstênio tem desafios extras, existem muitas cenas de ação, briga, cenas no mar que é dificílimo. Um ponto de atenção era traduzir aquela prosódia do personagem para a boca dos atores. Tungstênio foi uma adaptação bem complexa de ser realizada.
Como foi o processo de escolha do elenco? O processo de escolha do elenco é sempre mágico. Fizemos muitas oficinas com atores de Salvador até encontrarmos as pessoas certas para dar corpo e voz para aqueles personagens. O longa tem muitos personagens negros, o que tornou a procura por atores nos grupos de teatros locais maravilhosa. Foi um processo muito rico de troca e aprendizados. Tive a sorte de trabalhar com o Fabrício Boliveira e com Zé Dumont, e de achar a Samira Carvalho e o Wesley Guimarães.
Ainda sobre o elenco, especificamente sobre Samira Carvalho e Wesley Guimarães, não é a primeira vez que atores estreantes se destacam com importantes papeis em seus filmes. Você procura dar oportunidade para esses profissionais em todos os seus projetos? Especificamente em Tungstênio, como foi o processo para encontrá-los? Adoro encontrar atores novos, e trabalho com dois produtores de elenco geniais, Chico Aciolly e Ana Luiza. Os dois têm muito bom gosto para atores e adoram fazer escolhas ousadas. Eu também gosto. Acho importante trazer caras novas para o cinema e mais que isso, achar o ator certo para cada personagem.
Como se deu a preparação do elenco e qual foi seu método de trabalho com os atores no set? Você trabalhou com cada ator individualmente? Temos um método de preparação em grupo e individual. Por meio de várias técnicas, vamos achando o tom e aproximando os atores dos personagens, mas o mais importante nesse processo é estabelecer uma ponte de confiança entre ator e diretor. Um canal de comunicação permanente para os riscos e desafios do processo de produção de um filme, onde entra o restante da equipe. O processo de entendimento da dramaturgia e de como cada ator funciona é muito importante.
Do elenco à equipe de produção, você formou um time majoritariamente baiano. Foi proposital? Como se de essa escolha? Foi uma escolha natural, pois a Bahia tem equipes e atores maravilhosos. Tivemos a sorte de encontrar pessoas para defender este filme.
O longa levanta discussões muito presentes em nossa sociedade, como: as relações de poder, relacionamentos tóxicos, saudosismo militar, marginalização e até mesmo crime ambiental, entre outros. Juntos, esses temas provocam uma explosão e tensão social. Esse é o tema central da obra? Tungstênio é um filme que trata de relações humanas esgarçadas pelo entorno. A pobreza, a corrupção e a violência social pressionam os personagens em todos os momentos. O filme se passa numa região violenta e periférica. Um dos protagonistas é policial, o outro um pequeno traficante e por fim, temos um ex-militar saudosista da ditatura. Esses personagens são tragados para uma situação de conflito, a partir de um evento aleatório, um crime ambiental. De alguma maneira, Tungstênio captura muitos temas do Brasil atual. O Seu Ney, por exemplo, é um ex-militar, uma sátira, um retrato do Brasil atual. Nunca imaginei que teríamos uma possibilidade real de uma volta de um regime militar que pode se dar inclusive pelo voto. Tungstênio mostra um Brasil cheio de ódio, de relações esgarçadas e conflituosas. Traz o tempo do abuso de gênero, do racismo estrutural e vários outros temas importantes de serem debatidos. Acho um filme que provoca um olhar crítico para o País de hoje.
Os personagens são intensos e compartilham a violência (seja física ou verbal) como reação às suas fraquezas, gerando uma explosão de caos e sentimentos. Visivelmente, são personagens contemporâneos. Como você enxerga a relação Tungstênio x sociedade atual? Acho que Tungstênio capturou o ponto de tensão máxima que o Brasil chegou. Estamos a beira de um explosão de caos. Um momento em que o fascismo nos rondeia, em que as redes sociais criam bolhas de ódio que se chocam. Tungstênio mostra isso na vida real, na rua, no cotidiano e revela como a aparente tranquilidade pode ser rompida a qualquer momento. De uma maneira involuntário produzimos um retrato duro do País. Um Brasil onde a ideia romântica que tínhamos de nós mesmo foi deixada de lado.
Tungstênio aposta na força de um retrato social da Bahia que se reflete por todo o País. Cada história contada tem como personagem uma figura que vive às margens da sociedade e é tratada com descaso na vida real. Pensando no cenário atual do Brasil, como você acha que as pessoas reagirão ao assistir ao longa? Qual sua expectativa? Tungstênio é um retrato do Brasil real, do Brasil dos excluídos e pressionados por tensões sociais agudas, com a violência, o tráfico de drogas, as relações desiguais de gênero e o racismo estrutural e escravocrata que marginaliza uma parte importante da nossa população. O filme mostra isso de uma maneira forte e contundente e, ao mesmo tempo, é uma história dinâmica e efervescente que traz a linguagem dos quadrinhos para a discussão social. O filme vai ser visto com muito prazer em todas as regiões, e por todos os públicos. É um filme com linguagem sofisticada que traz um tema e uma narrativa forte, com personagens simples e populares. São bons os elementos no caldeirão e o caldeirão vai explodir. Tudo isso vai chamar a atenção e conquistar os corações do público que assistir. Não faltam razões para a identificação do público com o filme e com o País que ele retrata.
Nossos colunistas são voluntários e não recebem qualquer quantia do blog que não tem fins lucrativos.
* A opinião do filme ou das resenhas pertence ao colaborador que se compromete a enviar uma crítica de sua autoria para ser publicada no blog e divulgada nas demais redes sociais.
*Cabine de imprensa à convite da distribuidora.
Reinaldo!
ResponderExcluirImportante assistirmos filmes do gênero que trazem uma realidade nua e crua e que está ao nosso redor e por vezes nem enxergamos direito ou fazemos que não enxergamos...
Super entrevista, gostei de saber sobre como foi a escolha dos atores e tudo o mais.
“Nunca sei se quero descansar porque estou realmente cansada, ou se quero descansar para desistir. “ (Clarice Lispector)
cheirinhos
Rudy
TOP COMENTARISTA JUNHO - 5 GANHADORES
BLOG ALEGRIA DE VIVER E AMAR O QUE É BOM!
Oi, Reinaldo.
ResponderExcluirGostei do roteiro, por o mesmo ter um significado e trazer à trona assuntos idôneos e importantes.
Maravilhoso isso de transformar um quadrinho de sucesso em filme!! Não sabia deste lançamento e o título a princípio meio que assusta, mas ao ler a crítica a gente percebe que é um filme bem brasileiro, destes que mostra o lado sujo e ruim das periferias e também porque não, o lado ruim das pessoas,independente do lugar que vivem.
ResponderExcluirA separação de pessoas, de gêneros, de classe social é algo que assola nosso Brasil e se tiver oportunidade, quero muito conferir o filme e também procurar o quadrinho!
Beijo
Não conhecia a história, mas fico muito feliz de um trabalho nacional ganhar o seu espaço e ir pra telona, muito bom :)
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