domingo, 12 de maio de 2019

Menina que via Filmes: Kardec [Crítica]


Título: Kardec
Roteiro:  L.G. Bayão, Wagner de Assis
Direção: Wagner de Assis
Elenco: Leonardo Medeiros, Sandra Corveloni, Guilherme Piva, Guida Vianna, Genézio de Barros, Charles Fricks, Julia Konrad, Dalton Vigh, Letícia Braga e Jullia Svacina. 
Distribuição brasileira: Sony Pictures
Data de lançamento: 16 de maio de 2019
por Larissa Rumiantzeff

Kardec abre com uma cena que resume o ponto de virada do filme. O título surge em meio a várias pessoas sentadas em uma mesa redonda, as mãos abertas sobre a mesa. As mãos se afastam da mesa, e ela flutua sozinha, retratando um fenômeno que se disseminava rapidamente no mundo inteiro, em meados de 1840. Em salões, restaurantes, teatros, pessoas se uniam para fazer perguntas a mesas, que giravam em resposta. 
Somos apresentados então ao personagem título, que, a essa altura, ainda era León Rivail. O pedagogo discípulo de Pestalozzi na França gostava de fazer os alunos pensarem, e cultivava uma boa relação com as crianças. Por ordem de Napoleão III, a igreja católica se faz cada vez mais presente nas escolas, o que vai contra tudo o que León acredita (religião e educação não devem se misturar). Não demora para León começar a confrontar a ordem vigente. Adivinha só, ele acaba pedindo sua aposentadoria adiantada. 

Em meio ao período sabático forçado, fazendo freelas de tradutor, professor e contador, León começa a ser cada vez mais exposto aos fenômenos das mesas girantes nas sessões espíritas. 
Vejam bem, estamos falando de um pedagogo, cientista, escritor de vários livros sobre metodologia de aulas, em plena era do Positivismo na França. Alguém que não é religioso. Sendo assim, León tenta ao máximo explicar o fenômeno de uma forma lógica. E é claro que nesse meio havia muitos charlatães. Como pesquisador, ele começa a realizar experiências, tanto com as tais mesas quanto com as mensagens dos médiuns. 
O filme conta a trajetória de León até se tornar Allan Kardec e escrever o famoso Livro dos Espíritos, bem como a reação da Igreja católica frente a isso. 
Foi especialmente interessante o comentário feito sobre a necessidade da filosofia e do pensamento crítico nas escolas, e da razão como arma contra a intolerância e o preconceito frente ao desconhecido. Vale notar aqui que, como acadêmico e pesquisador, León sofre tanto com o preconceito do alto clero quanto dos intelectuais. Algumas cenas, apesar de supostamente se passarem no século XIX, pareciam atuais, como o repúdio ao que foge da tradição católico cristã e a queima de livros. 
Como produção nacional, Kardec me surpreendeu positivamente em vários momentos. Não posso dizer que se trata de uma obra de cunho religioso, pois tecnicamente o espiritismo não é uma religião, e sim uma doutrina, baseada na lógica, na pesquisa e na razão). A fotografia, as locações, a escolha das cenas (com destaque para a cena inicial) mostravam um dever de casa bem feito. O elenco era nacional, mas todos os textos, recortes de jornal, escritos, estavam em francês. A atenção aos detalhes foi digna de nota. 
Grande parte do elenco fez um bom trabalho. Os personagens principais foram interpretados por atores e atrizes globais, como Leonardo Medeiros, Dalton Vigh, Guilherme Piva, Guida Vianna e Genézio de Barros. Este último, aliás, eu nem reconheci como o padre Boutin. Minha única crítica a Leonardo Medeiros foi não ter atenuado um pouco o sotaque paulista para interpretar o papel. Por vezes, era preciso ver a catedral de Notre Dame ao fundo, para ser lembrada de que não se tratava de uma novela. Mesmo assim, o carisma do ator compensa e nos convence a torcer pelo personagem. 
Outros atores dignos de nota foram Sandra Corveloni, como a esposa de León/Kardec, e as atrizes que deram voz às médiuns, Guida Vianna, como a Madame Plainemaison, Letícia Braga, como Julie, e Jullia Svacinna, como Caroline. Essas duas atrizes últimas deram um show como a dupla de médiuns mirins, indo da inocência ao sombrio, sem errar a dose. 
Letícia Braga aliás, apesar da pouca idade, tem um vasto currículo, com papéis que vão desde séries infantis (Detetives do prédio azul) a outros títulos mais sérios, como “Os dias eram assim” e “A menina Índigo”. Não conhecia o seu trabalho antes, mas com certeza procurarei saber mais a respeito. 
Contudo, Kardec tem suas falhas. Aqui, o ponto fraco do filme foi nos diálogos ou na direção. Talvez por ser de época, ou por se passar em outro país, a impressão que se tem às vezes é de falas declamadas, como se fossem poesia. Entendo que a intenção fosse preservar o registro da fala na época, mas o efeito é uma certa falta de naturalidade nas interações. Não chega a estragar a experiência, mas é uma tendência observada em alguns filmes espíritas nacionais. 
No geral, recomendaria Kardec para todos que tenham interesse na história do Espiritismo, em história em geral. Não acredito que seja necessário ser espírita para aproveitar o filme, pois apesar de falar da ótica espírita, trata-se de uma narrativa histórica, sobre uma experiência humana que continua atual, acredite você ou não em mesas girantes. Mas não precisa ter medo: apesar das mesas e das médiuns mirins, não possui cenas fortes.  
É interessante, cativante, e valerá a pena. 

*Cabine de imprensa à convite da distribuidora
*Nossos colunistas são voluntários, os textos assinados por eles são originais de suas autorias.


2 comentários:

  1. Mesmo que hoje em dia todo este universo do espiritismo esteja um pouco distante de mim, tenho dado uma boa olhada neste filme que deve realmente ter sido muito bem produzido.
    Até pelo time de atores que está bem acima do normal!! Gosto muito desta visão, deste olhar a vida, por outro ângulo.
    E Kardec acho que foi sempre assim, pelo pouco que sei.
    Claro que verei!!!
    beijo

    ResponderExcluir
  2. Não conhecia Kardec e nem estava sabendo do filme, achei bem interessante, que bom ter uma produção brasileira com esse nível

    ResponderExcluir

Sua opinião é muito importante para mim! Me diga o que achou dessa postagem e se quiser que eu visite seu blog, informe o abaixo de sua assinatura ;)