Título no Brasil: O pássaro pintado
22 de outubro 2020 / 2h 49min / Drama, Guerra
Direção: Václav Marhoul
Elenco: Stellan Skarsgård, Barry Pepper, Harvey Keitel
Nacionalidades República Tcheca, Ucrânia, Eslováquia
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O pássaro pintado conta a trajetória de um garoto que, durante a segunda guerra mundial, vê-se forçado a deixar seu abrigo. Mostra, em uma sequência de eventos e relacionamentos com outros personagens, a luta por sobrevivência e para encontrar o caminho de casa – que ele nem mesmo sabe onde fica.
A estrutura, formada por encontros consecutivos com diferentes personagens, foi capaz de me prender desde o início. Tive uma curiosidade em compreender esse contexto histórico tão bem colocado e em detalhes. O protagonista sofre o tempo inteiro, mas após um primeiro baque, temos um respiro. É apresentada a sociedade extremamente supersticiosa e preconceituosa, sempre alerta e cheia de receios quanto à estranhos, sempre temendo a chegada da guerra e de seus horrores.
Acompanhamos esse menino que tenta manter seu olhar inocente para o mundo, tenta obedecer, mesmo após tantos abusos, a recomendação de sua tia e deixar os sapatos sempre limpos. Ele passa de pessoa a pessoa, sempre usado como (no mínimo) mão de obra, aprendendo uma infinidade de pequenas habilidades. É fortíssima, de início, a associação de uma pureza, ainda presente em resquícios no garoto, e os animas. Em meio a loucura de uma guerra que nem mesmo chegamos a ver (ainda), os animais se apresentam como os únicos isentos de culpa e a marca maior da brutalidade humana está nos maus tratos de um cavalo, um bode, um pássaro.
O filme traz uma sensibilidade muito grande ao tratar desse protagonista, e pelos olhos dele entramos no contexto histórico. O choque vem do que deixa de chocá-lo, do que ele passa a fazer com naturalidade, como algo inevitável. O menino presencia muito horror nos primeiros dois terços do filme, sem nem mesmo chegar perto da guerra. Contraposições marcam a força dos momentos mais brutais, ele passa por desgraças que nenhuma criança deveria saber que existem, depois o vemos se comportando, por uma breve cena, como o menino que é.
Posso não ter compreendido alguma mensagem que estava sendo passada, mas para mim a sensibilidade peca quando se aproxima de uma personagem feminina, principalmente aquelas colocadas para serem atraentes. Há hipersexualizações cujo motivo eu não entendi, e só me pareceu cair na ideia machista de que a mulher sedutora é a culpada de uma raiz de maldade no homem. Foi tão gritante que fico realmente achando que não entendi alguma coisa. Outra cena foca no rosto de uma jovem que se encaixa nos padrões de beleza atual, só para nos mostrar depois que ela será abusada. A personagem não aparece nenhum momento antes, nem depois.
A parte final do filme se afastou bastante da expectativa que eu tinha desenvolvido. Não me agradou, achei que volta um pouco para o lugar comum das histórias de guerra e tem alguns problemas de coerência. Porém, como se trata de uma questão de expectativa, não vejo motivo em retirar o quarto claquette e colocar o filme como apenas ‘bom’. O fato de ser em preto e branco me atrapalhou um pouco, tive dificuldade de reconhecer alguns rostos que pensei que deveria, me perdi entre os personagens. Há a questão feminina mas, fora esses aspectos, é um filme impressionante.
É cruel e forte e emociona. Eu me esqueci que era a história de um jovem judeu na segunda guerra, apesar de seus olhos escuros, e algumas passagens tomaram outras conotações talvez ainda mais fortes. Gostei deste impacto, por isso mesmo só menciono a origem judaica do garoto aqui. Tomei um susto na última cena, imaginando que algo completamente diferente ia acontecer, mas o que de fato nos é mostrado teve muita força, fechou bem a história.
Gabriela Leão é carioca e advogada, mas sua maior afinidade com o mundo das histórias fez com que se afastasse da profissão para estudar Literatura e técnicas de produção de roteiros. Escritora, tem dois romances policiais publicados: ‘A Mulher no Lago’ e ‘Tentativa’. Participou de diversas antologias no gênero do terror e, por ser incapaz de se prender a um gênero, publicou histórias de fantasia no Wattpad.
*filme assistido à convite do cinema Virtual
* A plataforma de streaming Cinema Virtual exibe, a partir de 8 de outubro, o “Festival Cinema pelo Mundo”, com produções de diversos países que ressaltam a riqueza de culturas diferentes no mundo globalizado. Cada sessão do Festival Cinema pelo Mundo, válida por 72 horas em até três dispositivos, custa R$19,90.
Gabriela!
ResponderExcluirAcredito que a questão da hipersexualização e do machismo, é porque era assim que as mulheres eram vistas naquela época e acredito que foi o que quiseram mostrar, que não apenas o preconceito pelos olhos da criança, mas também, as maldades que eram feitas às mulheres.
cheirinhos
Rudy
Ah..como foi bom chegar aqui e encontrar a crítica desse filme. Eu amei, amei do começo ao fim e chorei o tempo todo.
ResponderExcluirTá, o fim acaba ficando mais do mesmo, por meio que normalizar a dor ou como se todo o sofrimento do menino não tivesse servido pra nada.
Mas eu sou fascinada por filmes preto e branco. Por poder ver os rostos marcados.
O fanatismo religioso é um ponto algo do filme e dói, dói muito!!!
Super recomendo, super!
E espero que a Raffa veja também!
Beijo
Angela Cunha Gabriel/Rubro Rosa/O Vazio na Flor