quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Menina que via filmes: Amor, Sublime Amor

 












Título: Amor, sublime amor

Título em inglês: West Side Story

Gênero: Musical/Romance

Roteiro:  Tony Kushner

Direção: Steven Spielberg

Produção: Amblin Entertainment,

Produtora executiva: Rita Moreno

Elenco: Ansel Elgort, Rachel Zegler, Ariana DeBose, Rita Moreno, David Alvarez, Mike Faist, Ezra Menas.

Distribuição: 20th Century Studios

                     Data de lançamento: 9 de dezembro de 2021

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                                              Por Larissa Rumiantzeff

Em uma época de remakes, alguém poderia perguntar, será que era necessário adaptar o musical clássico West Side Story (1961), com músicas de Leonard Bernstein, e letras de Stephen Sondheim? Será que não vai desvirtuar um clássico com uma versão “politicamente correta”?

A resposta para as duas perguntas é sim, e não. Sim, o clássico de 1961, inspirado no musical da Broadway e situado em uma Nova York dividida entre gangues rivais tinha vários elementos que pediam desesperadamente por uma renovação. Atores pintados de marrom, sotaque espanhol fajuto, e questões datadas. Se eu tinha medo do resultado, considerando o tamanho da hype em torno do lançamento desse filme? Com certeza. A capinha do meu celular é o poster do filme, então vocês podem ter uma ideia das minhas expectativas. Agora, se ia desvirtuar ou deturpar o original, isso vai da visão do diretor e da cabeça do espectador.

Tenham em mente que a produção de 1961 já era uma adaptação de um musical da Broadway, que por sua vez, era uma adaptação do clássico Romeu e Julieta, de Shakespeare, então o debate todo sobre uma adaptação estragar um clássico é improdutivo, na maioria das vezes. Até porque a função das adaptações é trazer um novo olhar para uma produção, e tornar a obra original cada vez mais viva e atual. Mas fiquem tranquilos. Devo dizer que Spielberg fez um trabalho que superou a hype em vários sentidos. Com o olhar de Rita Moreno na produção executiva, deixou a obra ainda mais atual, e emocionante. E deu uma nova vida ao casal protagonista. Só de escrever essa resenha eu estou arrepiada de novo.











Nos anos 50, a área do Upper West Side de Nova York está em franca transformação. A modernização do bairro significa que, em breve, muitos moradores terão que se mudar. Em meio a isso, o bairro é dividido pela guerra entre duas gangues rivais, a dos Jets, composta por imigrantes brancos de origem polonesa, italiana e irlandesa, e a dos Sharks, composta de imigrantes porto-riquenhos. Por mais que ambos sofram com o preconceito por serem imigrantes e a perseguição da polícia, a corda acaba arrebentando para o lado dos Sharks, pela questão da língua espanhola e da cor da pele.

Maria (Rachel Zegler) é irmã mais nova de Bernardo, líder dos Sharks. Recém-chegada aos Estados Unidos, a moça divide um apartamento com o irmão e sua noiva, Anita. Em um baile comunitário, ela conhece Tony (Ansel Elgort), melhor amigo de Riff, líder dos Jets. Desse encontro, surge um amor proibido e praticamente condenado por todos à sua volta.

Vamos aos pontos que foram transformados e (muito bem) atualizados:

Um dos maiores acertos de Spielberg foi se atentar para as questões que já eram problematizadas na versão original e torná-las ainda mais atuais. Ninguém reinventou a pólvora. Só deixou a pólvora mais explosiva...

A briga entre as gangues, que existe em todas as versões ganhou um olhar mais humano. Há um debate mais aprofundado sobre o racismo, que já era discutido na primeira versão, ainda que executado de forma precária, com o que se tinha de ferramentas na época e com o olhar que se tinha dos imigrantes na época. Inclusive a escalação de Ariana de Bose como Anita trouxe para a história uma camada a mais, visto que, dentro do preconceito que os Sharks já enfrentam por serem imigrantes, Anita sofre um pouco mais por ser uma mulher negra.

Por falar em escalação, nada de brown-face em 2021. Os atores escalados para fazerem parte dos porto-riquenhos ou são latinos ou têm ascendência latina. Rachel Zegler tem ascendência colombiana. Além disso, Spielberg colocou diálogos inteiros em que os porto-riquenhos alternavam entre o espanhol e o inglês, e nenhum dos idiomas foi legendado no original, por uma questão política. Esse efeito estrangeirizador causa um estranhamento e tira o espectador falante de inglês da zona de conforto, em um filme que aborda o apagamento de imigrantes latinos. É importante notar que falantes de inglês dos Estados Unidos e do Reino Unido não estão acostumados a ver filmes estrangeiros, sendo esse ponto uma questão de humor em vários sitcoms e filmes, em que o personagem que assiste filmes legendados é considerado mais culto. Em Friends (1994-2004), o Ross é o único do grupo que assiste filmes legendados. Em Como eu era antes de você (2016) Will influencia Amelia a passar a ver filmes legendados.

Amei a escolha. Eu chamo de reparação histórica.

Em várias cenas o policial hostiliza os imigrantes, não apenas os Sharks, por falarem espanhol, reprimindo e mandando que falem inglês nos Estados Unidos.

Rita Moreno, que no original interpretou Anita, agora volta como Valentina, uma nova personagem de origem latina, esposa do (supostamente) falecido Doc, e chefe do Tony. Valentina também é porto-riquenha, e a presença da personagem desmonta um pouco da animosidade do rapaz contra os porto-riquenhos. A química entre os dois é a coisa mais fofa.

Outro membro do elenco original que voltou para a produção, embora nos bastidores, é Russ Tamblin, que fez o Riff no original. Tamblin, pai da também atriz Amber Tamblin, é dono da Amblin Entertainment, e foi responsável pela produção da nova versão.

Tony agora tem um motivo a mais para ter se afastado dos Jets. Antes da história começar, ele foi preso por agredir quase fatalmente um rapaz, e passou um tempo na cadeia. Isso o transforma. Durante os acontecimentos do filme, ele está em liberdade condicional, e não pode sair depois do anoitecer.

Maria aqui também não é apenas uma moça apaixonada. Spielberg parece não ter visto somente o filme original, mas realmente estudado suas origens. A Maria de Rachel Zegler é divertida e romântica mas também corajosa, bate de frente com o irmão, quer ser dona do próprio destino e inclusive discute racismo com Anton. Sim, o casal tem mais de um encontro e mais oportunidades de se apaixonar, tornando o romance um pouco mais verossímil. A versão de Spielberg faz você realmente torcer pelos dois.

Me perguntei se uma das cenas mais dolorosas de assistir, que motiva os acontecimentos da última parte, estaria presente, e como estaria. Não me decepcionou. Na primeira versão, Rita Moreno, na pele de Anita, ia até o bar do Doc dar um recado de Maria a Tony. Nessa versão é De Bose, e as duas Anitas se encontram em circunstâncias difíceis. A cena não muda, a não ser por alguns detalhes que dizem: somos mulheres e estamos no mesmo lado, independente de qualquer coisa. Inclusive com Grazie, um antigo flerte do Tony presente na cena. Não posso dar detalhes.

Outro elemento que recebeu mais destaque foi a escalação do ator e cantor trans Ezra Menas como o neném Anybodys. O tomboy da história, que sofre preconceito do próprio grupo, não teria um enfoque completamente diferente, pois a história ainda se passa nos anos 50, com a cabeça dos anos 50. Nem sei qual era o termo usado na época. Calma que não tem revisionismo histórico. Mas deram mais voz, literalmente, a uma personagem que vivia correndo atrás dos Jets, tentando pertencer à gangue, e tem seu valor reconhecido no final. Aqui os dias de glória chegam antes.

Como eu disse antes, adaptação não é cópia, e apesar das músicas não terem sido alteradas, algumas mudaram de intérprete, de cenário e de ordem na trama, para atingir o efeito desejado. Na música America, por exemplo os dançarinos não estão na laje do condomínio, mas dançam e cantam à luz do dia, e passam por imigrantes que protestam nas ruas. A música cool, que no original era interpretada por Ice, agora é um dueto entre Tony e Riff, enquanto brigam.














Uma escolha que não sei se funcionou muito bem aqui foi a questão da tradução das músicas. Não me entendam mal, eu sou tradutora e meus panos estão todos prontos para passar, ainda mais quando se trata de tradução de música, em que tem que se atentar à letra, à métrica e à musicalidade. Quem souber fazer (bem) tudo isso, que atire a primeira pedra. Nesse aspecto a tradução ficou impecável.

Minha questão é com a priorização da métrica e as rimas, em uma legenda, modo onde o original é confrontado com a tradução. Nesses casos, o espectador sente falta do significado do que estão dizendo, não tanto da rima. Tentei achar o tradutor das legendas, mas não a encontrei até a entrega desta resenha.

Em meio a debates atuais sobre racismo, brutalidade policial, e xenofobia, é bem capaz de que esse filme esteja muito mais relevante agora, do que na sua primeira versão. E Spielberg fez jus a ele, com uma produção emocionante, dando voz a quem pedia por ela.

 

*Larissa Rumiantzeff assistiu ao filme em cabine de imprensa à convite da assessoria 

4 comentários:

  1. Adaptações sempre dividem opiniões, pois há a galera que não gosta de mudanças, e a galera que gosta de ver várias versões do que gosta.
    Particularmente tenho certo receio quanto às adaptações.
    Que bom que essa versão não decepcionou.

    Danielle Medeiros de Souza
    danibsb030501@yahoo.com.br

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    1. Muitas vezes dividem opiniões pelo que se espera delas. Se você (digo vc em geral) espera uma cópia da obra de origem, garanto que vai sempre se decepcionar. Adaptacao, para atender ao proposito, costuma mudar algo, trazer pra outra época; outra realidade social. Teve gente que não gostou muito da reduçao de coreografias. Eu amei esse aspecto. E muitos outros que tornaram a obra mais atual.

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  2. Eu admito que musicais não são muito minha praia não. Tá, eu vi Tik Tik boom(é esse o nome? rs) bem recente e amei muito, muito!!!
    Mas não sabia desse super lançamento e oh, gostei do elenco.
    Devo ver com certeza, mesmo torcendo o nariz, como sempre faço rs
    Beijo

    Angela Cunha

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  3. Sempre que vejo um filme clássico ser recriado, fico com o pé atrás. Mas me parece que a essência dessa bela história foi mantida, só atualizaram o que era necessário

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